O trauma histórico é um testemunho indesejável que acompanha a vida de muitos povos. A tomada de consciência a partir da memória ancestral revela uma sequência de acontecimentos drásticos de nossos antepassados.

O impactante relato da liderança indígena Tapuia Paiacu de Apodi, Lucia Paiacu Tabajara, diante das covas dos 70 tapuias assassinados no sítio Viçosa no pé da serra de Portalegre (1825), se transforma em verdadeira dor com o tom da denúncia. “A gente tem que preservar e contar essa história, não é pra fazer estudo porque não somos ratos de laboratório. É muito emocionante toda vida que venho aqui, fico muito ofegante. Depois de tomarem as terras deles e ainda fazer esse massacre, aí tomaram a várzea do Apodi, tomaram a chapada, e as terras de Portalegre foram distribuídas entre os políticos, os canalhocratas”.
E continua a “colonização de cada dia, famílias indígenas não ter onde morar, não ter suas terras, para os povos indígenas a terra é tudo”, desembucha Lúcia Paiacu, que fundou e administra o primeiro museu indígena do Rio Grande do Norte, com o propósito de preservar a memória dos povos originários entre documentos e peças líticas de cinco a dez mil anos.

Em meio ao território carregado de história, memória e identidade, o Museu do Índio Luiza Cantofa localizado no município de Apodi/RN, é um lugar de resistência. Uma conquista do Povo Tapuia Paiacu que reforça a memória e preserva sua identidade indígena que nos ensina ir adiante com nossos espíritos livres.

Lutador das ligas camponesas, Mery Medeiros foi preso político durante a ditadura militar na década de 1960. Com o objetivo de preservar a memória de uma geração que foi massacrada pelo golpe militar, ele e vários outros ex-presos políticos fundaram a Associação Norte-rio-grandense de Anistiados, levando para as reuniões mensais cerca de 150 companheiros e companheiras que sofreram tortura ou tiveram perdas irreparáveis porque lutavam por justiça social.
Porta-voz dos anistiados em nosso estado, Mery sentiu por toda sua vida a dor como testemunho da história. Mesmo assim, durante entrevista ao Coletivo Foque (2008), afirmou que o mais importante era a juventude saber que o golpe militar de 1964 foi dirigido contra a classe operária e estudantil. Para isso, não se cansava de levar esse debate para universidades e escolas secundaristas.
O potiguar Emmanuel Bezerra, filho de pescador, militante do movimento estudantil, ex-presidente da Casa do Estudante, integrou o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e o Partido Comunista Revolucionário (PCR), vivendo boa parte da sua juventude na clandestinidade. Foi torturado até a morte (1973) pela ditadura brasileira. Assim como o estudante paraense Edson Luiz, assassinado aos 17 anos com um tiro à queima roupa no peito, disparado pelo comandante da Polícia Militar Aloísio Raposo, no dia 28 de março de 1968, durante uma manifestação contra a elevação do preço das refeições no restaurante Calabouço [Rio de Janeiro]. Mais um crime cometido pela ditadura que investiu pesado na repressão contra o movimento estudantil e demais protestos que tomavam conta do país.
Além de muita gente que até hoje sofre as consequências deixadas pela ditadura militar, entre tantas e tantas histórias de horror e crueldade que amarguram profundamente a vida de pessoas que tiveram suas identidades cassadas.
Auschwitz, maior símbolo do Holocausto (1939-1945) e campo de concentração na Polônia ocupada pelos nazistas, é mais um testemunho de muita dor. Cerca de 1 milhão de judeus foram mortos apenas naquele campo.
É importante saber que onde quer que exista dor e testemunho dessas dolorosas opressões, haverá a histórica resistência de sempre. Como bem disse o historiador Luciano Capistrano: “Lembrar para não esquecer”.