QUANDO FUI CONVERSAR com o saudoso amigo folclorista Zé Cavalcanti, em sua casa, em João Pessoa/PB — este com idade já de ser meu pai — o vi se apressar em colocar os óculos, aparelhos nos ouvidos e retirar a chapa do copo d’água. Colocando os apetrechos da velhice, sempre de bom humor e alegre, me foi dizendo: “Meu jovem Gutenberg, estou feito peça de museu: com tudo no mesmo lugar, mas nada funcionando!”. Não quero, mas, se viver muito, ficarei assim.
Ando com muito cuidado para escapar dos tropeços e quedas. Meu banheiro tem segurador nos lados. Não pego muito peso e evito raiva, principalmente a de me encontrar com gente ruim. Prefiro, de vez em quando, encontrar com amigos de cinquenta anos de amizade. Almoçar e dar risadas. Relembrar o tempo em que pulávamos cercas e muros para roubarmos saborosas mangas espadas e rosas do sítio do doutor Choque, no Alecrim. Ou escapar do negro Bernardão que nos mandava de volta para a calçada do Clube Atlântico, da Alexandrino, também no Alecrim.
Vocês podem não acreditar, mas recentemente fui recepcionado por um irmão amigo que me recebeu em sua casa com buchada de carneiro e cachaça da Paraíba. Cachaça da boa! Coisas que os jovens não conhecem, ou por dietas ou porque não podem. Viver bem é uma grandiosa arte, mas para poucos. O sábio e grande Vinícius de Moraes sabia dessa arte, deixando em seu estatuto: “Nunca fiz amigos, bebendo leite!”. E recordar com lirismo e alegria, até podemos, mas nunca chorar o leite derramado, como diz o povo em seu folclore oral. Leio todos os dias. Escuto músicas, converso com o povo de minha morada da Nísia Floresta. Agora vou terminar essa prosa como os antigos folheteiros de cordéis da minha feira do Alecrim. Av. 1: “Não vou contar o pulo do gato e nem o resto do meu segredo de viver bem, senão vocês vão simbora e eu fico liso e sozinho…”.
Dedicado ao amado grupo de jovens dos sete de Natal. Gutenberg Costa.
Morada São Saruê, Nísia Floresta/RN.