Ariano Suassuna e Kydelmir Dantas

Os dois nomes acima citados, que dão nome a esse texto, são de dois ilustres paraibanos: escritores, folcloristas e pesquisadores.

Ariano, nascido na capital, em João Pessoa/PB, a 16 de junho de 1927, e encantado em Recife/PE, a 23 de julho de 2014. Confesso que estive em diversas conversas com o famoso Suassuna. Encontros, seminários, congressos literários, feiras de livros, muitas foram as cidades. Assisti a muitas de suas aulas e prosas. Sua maneira simples e risonha, contando sempre histórias e causos, deixando rastros de humor e realismo relacionados ao nosso ‘entreguismo’ cultural, do nordestino que prefere a coca-cola ao nosso delicioso caldo de cana. Escuta estrangeirismos musicais no lugar de um Luiz Gonzaga ou Jacson do Pandeiro. Nordestino que não se respeita não sabe de suas origens e não valoriza as suas tradições. Vão até para os Estados Unidos em vez de Juazeiro do padrinho Cícero Romão Batista. Eita, bixiga taboca!

Ariano ficou de certo modo associado ao conservadorismo radical e intelectual.  Lembro uma das fotos em que estou ao seu lado, feita em um congresso educacional, em Crato/CE (2004), quando lhe repassava o meu livro recém-lançado – Dicionário dos Cordelistas do RN. Ele recebeu, riu e diante do peso da obra em questão, ainda brincou: O danado é que o que tem de bom tem de pesado! Elogiou a diagramação e a pesquisa com as fotos: Você salvou muita gente do esquecimento e só por isto, merece meus aplausos. Como o velho Ariano faz falta hoje em dia, justo nesta era da inteligência artificial e bagunça cultural nordestina onde não se tem mais nada com autenticidade do passado. Se brinca carnaval no São João e São João no carnaval. É muito perigoso cutucar onça com vara curta… Cala-te boca!

Geralmente, sempre que escrevo minhas besteiras, recorro às frases do genial Ariano Suassuna, como ilustração de pensamentos, e aqui vou deixar uma delas: Como sou pouco e sei pouco, faço o pouco que me cabe me dando por inteiro. Neste ano, celebramos o décimo aniversário de seu encantamento. Com certeza, o velho profeta deve estar proferindo suas belas e provocativas aulas nos reinos encantados das Pedras Bonitas ou nos Autos das Compadecidas.

Essa conversa de cerca-lourenço é só para falar também do amigo irmão Kydelmir Dantas, que recentemente lançou seu mais novo trabalho literário de pesquisas, intitulado – Ariano Suassuna na Literatura de Cordel, 136 páginas, com ilustrações, pela editora natalense Offset. Obra para ser lida por pesquisadores da temática nordestina e seus folhetos chamados cordéis. Livro para ser adotado por escolas e discutido nas feiras e mercados do convívio cotidiano do nosso povo.

Seu autor vem das minhas amizades sinceras e antigas, desde o tempo em que trabalhava e morava em Mossoró. Eu e ele, de cabelos pretos, rodeando as inteligências de Raimundo Soares de Brito e Vingt um Rosado. Dois inesquecíveis e saudosos mestres do RN.

Kydelmir já vinha em disparada com suas pesquisas, publicando várias obras de valor histórico e cultural, especialmente para o nosso Nordeste. Retornado ao seu berço nascedouro, Nova Floresta/PB, vem cada vez mais nos brindando com novos títulos, abordando de Luiz Gonzaga a Ariano Suassuna. Sempre na linha da ética e da seriedade. Escreve para o povo as histórias desse mesmo povo. O Kydelmir é antes de tudo um apaixonado e destemido folclorista, embora assim não queira se apresentar, mesmo sendo honrado e justo verbete no Dicionário de Folcloristas Brasileiros, do saudoso mestre e amigo Mário Souto Maior, (2000). Nome citado em inúmeras obras e sempre consultado por quem pesquisa os assuntos nordestinos. Quando uma amizade me diz que está pesquisando sobre cinema nordestino, bandas de músicas, violeiros, cordelistas e outros tantos temas, eu indico logo um pesquisador da área: Você já leu o Kydelmir Dantas, já o consultou, já o visitou em Nova Floresta?

Juntos, já desbravamos quase todo o sertão nordestino em busca de rastros das nossas histórias. Do cangaço a nossa religiosidade popular. Do cangaço a nossa boa música, o pesquisador Kydelmir se mete, com propriedade, saber e conhecimento, como poucos. Quase todos os dias eu estou a consultá-lo sobre variados assuntos. E o teimoso e irrequieto Kydelmir segue na sua labuta cultural, quase sempre sem apoios culturais, como a maioria dos pesquisadores sérios desse Brasil injusto culturalmente.

Parabéns, amigo quixotesco Kydelmir Dantas! A Paraíba e o RN lhes devem muito diante de suas contribuições históricas. Confirmando aquele dito popular e profético: Santo de casa, não obra milagre! E reconhecimento cultural, é coisa muita rara, partindo do chão dos bravos pesquisadores.

Aqui deixo o meu pequeno relato de um livro, do seu autor e do seu homenageado. Tudo de corpo presente e com sinceridade amiga. Nada de floreios falsos ou oportunistas de encomendas. Acredito que os elogios verdadeiros são aqueles escritos com o coração e a razão. Comentários, sem os homenageados pedirem ou mesmo até de surpresa. Como me dizia um sertanejo de bom humor que conheci, em suas despedidas: Que me perdoe as falhas e besteiras já ditas, e quem vier depois de mim, que feche a porteira bem fechada!

Outubro de 2024. Morada São Saruê/Nísia Floresta/RN.

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