Photography By – Stefano Bragantini; Photography By [Edited] – Giovanni Sérgio

Dia desses um amigo, através do Zap – único meio de comunicação que chega aqui no meu isolamento, ou como alguns dizem, meu ‘paraíso’, me sapecou a pergunta curiosa: “Amigo Gutenberg, você conheceu o artista Tico da Costa?”.

Indagação que mexeu comigo e lhe respondi afirmativamente. Ainda contei algumas passagens vividas, como parte dessa amizade ‘ticostiana’, a qual, infelizmente, não durou muito, como deveria durar as boas irmandades. Amigo é aquele que não foi gerado no ventre de nossa genitora, mas a gente sente que veio para o seio familiar mesmo. É uma escolha do coração livre, sem pressão, subserviência ou interesses algum.
Tico da Costa me foi apresentado, ou apadrinhado, como costumo me referir, pelo mestre e amigo saudoso folclorista Deífilo Gurgel, com louvores de conterrâneo da cidade de Areia Branca: “Gutenberg, este é o amigo Tico da Costa, um artista famoso além do Brasil…”. E dando prosseguimento às conversas na área frontal da casa de Deífilo, vimos em pouco tempo que morávamos na mesma região da Zona Sul de Natal, portanto, estavam facilitadas as futuras visitas em nossas casas, além de encontros em bares e restaurantes das proximidades. Como dizem nas feiras – ninguém é de ferro!
A partir de então, ele chegava, mesmo sem agendar nada em minha morada, com seu automóvel e o inseparável violão. Dizem que coisa muito acertada nem sempre dá certo! Às vezes, chegava e ficava sentado em uma das cadeiras que já estavam em minha área à espera de amigos e prosas. Pegava o violão e com plena liberdade começava a cantarolar suas próprias composições alegres e emotivas. Confesso que não as conhecia. Santo de casa, é nosso grande erro não conhecer antes dos ditos forasteiros…
Não é pecado dizer que ali estava criado um clima de amizade e bebedeira, e não se resiste a uma boa música e conversas culturais sobre tudo apenas tomando leite, como dizia o gênio Vinícius de Moraes. E o Tico ia nos intervalos musicais contando suas aventuras quixotescas pelo mundo quase todo em que já viajara, morara ou vivera artisticamente. Todo mundo lá de casa sabia que ali não haveria vassoura atrás da porta e o ilustre visitante e famoso cantor/compositor não tinha hora para sair de minha casa. Dizem que tapera de amigo é continuidade de nosso chão. Aprendi com minha mãe, dona Estela, a arte de bem conviver e prezar aqueles que também me recebem bem em seus terreiros.
Algumas vezes, dizia-me com lágrimas nos olhos claros que voltaria para a Europa, aonde era muitíssimo respeitado como artista-músico. Seu coração tão generoso estava fincado entre Areia Branca e Natal, mas como todo irrequieto aciganado, tinha os pés no oco do mundo. Uma noite, Tico aportou alegre com um presente para mim debaixo do braço. Um disco vinil seu com uma gentil dedicatória. As boas surpresas são reservadas aos bons amigos e amigas. Sempre aprontam uma, quase nos matando do coração. É a arte divina do bem querer, como afirmam os poetas e líricos.
O Tico era um tipo com cabelos alongados e claros, olhos pequenos e vibrantes. Sorriso largo e fácil nas gargalhadas. Magro e de bom humor como um daqueles santos personagens de romances medievais. Sinto que as pessoas especiais que nos rodeiam, como verdadeiros amigos ou irmãos, até parecem que não são criaturas desse nosso mundo, tão cruel e mercantilista, que só enxerga o dinheiro em tudo em sua volta…
Nossos bate-papos iam da música popular brasileira aos tipos populares de rua da sua Areia Branca, terra que eu conheci levado pelo citado mestre e saudoso amigo Deífilo. Não posso mentir e dizer que a nossa amizade foi longa, até porque sua partida foi quase que repentina. Sem aquela combinada despedida. Até parece que foi chamado antes da hora, para desagrado de seus familiares e amigos mais chegados.
O amigo Tico está vivo em nossas memórias, como também no verbete da magistral obra da música do RN, da amiga pesquisadora Leide Câmara. Ficou para sempre, como devem ficar aqueles que só vieram para espalhar bondades e boas e eternas amizades.
Na oportunidade de seu encantamento, lhe dediquei algumas palavras e enviei para o vespertino ‘Jornal De Hoje’, no qual sempre publicava minhas coisas alegres. Dessa vez, lamentavelmente, fazia registro da viagem surpresa do ‘Tico’, meu amigo, para o reino do paraíso, aonde uns dizem que se volta e outros não. Não vou discordar das duas opiniões, apenas vou dizer que, com certeza, esse tal lugar tão florido deve nos receber com rede, alpendre, sombra e fartura de conversas e amigos. Se não, nada nos valerá a pena pensar nessa terra prometida pelos religiosos!
Aqui deixo todas as merecidas homenagens para o nosso grande Tico da Costa, o qual veio ao chão do nosso RN em 13 de novembro de 1954 e ‘zarpou’ à francesa, em 29 de agosto de 2009.
Aplausos e mais aplausos, leitores, leitoras, amigos, amigas e familiares do genial cantor e compositor, meu amigo Tico da Costa.
Morada São Saruê, Nísia Floresta/RN

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