Casa de mãe Joana e pesquisas…

Geralmente quando leio nos meios eletrônicos, já que os impressos são poucos, fico triste diante de falsas informações quanto às pesquisas históricas divulgadas com datas erradas ou sem fontes fidedignas que as confirmem.

Quando leio algo histórico, observo logo aonde o autor do texto pesquisou. Em artigos e livros vou logo à bibliografia consultada, mesmo antes de ler o dito miolo. Mas, com todo o respeito, tenho mesmo a impressão que algumas coisas que leio são psicografadas. Vejo autores tratando a história passada como se a tivesse vivido. Segundo, ‘Beltrano’ ou ‘Sicrano’, não existem. Tenho vários romances históricos em minha biblioteca, gênero que gosto, com a bibliografia em seu final. Vou citar apenas um dos autores, como o Jô Soares. Uma coisa são as memórias com suas fontes pessoais, e outra, são as histórias acontecidas antes mesmo do nascimento dos ditos pesquisadores…
Meus mestres me ensinaram que ao pesquisar trate logo de se abastecer de livros sobre o assunto, primeiramente. Depois vá para a pesquisa de campo com suas fontes orais. Já vi livros com pouca bibliografia ou fontes alheias ao assunto pesquisado. O que chamamos de ‘livro de livros’. Sobre cangaço, nem se fala, em cada esquina tem pesquisadores, alguns até palestrantes, fazendo a sua história deturpada dos fatos reais.
Na literatura de cordel, outro dia soube que um destes andou dizendo que o cordel começou a ser comercializado em Natal nos anos 2000, do século XX. Já outro, que se diz pesquisador, ficou sem graça e logo foi me evitando quando lhe perguntei se havia em seu acervo as principais obras sobre a temática de Câmara Cascudo, Veríssimo de Melo, Gumercindo Saraiva, Umberto Peregrino, entre outros. Isso sem falar nas centenas de autores e sérios pesquisadores dos nossos folhetos poéticos de feiras e mercados do meu tempo.
Essa semana, o amigo pesquisador César Barbosa, ou como ele assina às vezes seus textos, Chico Potengy, me dizia que Natal estava com uma enxurrada de pesquisadores. Alguns, blogueiros com informações totalmente errôneas. Até com fotos da escritora Isabel Gondim aparecendo como sendo a famosa intelectual Nísia Floresta. E com a legenda – que a primeira citada seria a segunda quando mais moça. Essas situações me fazem até lembrar que em 1997, ano do meu ingresso no centenário Instituto Histórico e Geográfico do RN, lá ouvi um jovem bem falante se dizendo pesquisador do mestre Câmara Cascudo – Você pesquisa Cascudo e tem vários livros para publicar sobre o mesmo?
Meu jovem, fique sabendo que pesquisa é coisa muito séria. Saí de perto e até hoje estou a esperar os frutos dessas tais pesquisas.
Já apareceu na minha casa gente atrás de fotografias sobre o carnaval natalense, dizendo que era para tese de mestrado. Sobre literatura de cordel, idem. E quanto aos meus livros antigos sobre cangaço eu os recebi com interferência de uma queixa em uma delegacia. Vivo isolado e escaldado com medo de água fria, feito gato. Faltou apenas ética e o bom senso a um que veio e foi ajudado com minhas pesquisas sobre rezadeiras do RN, assunto ainda inédito. E quando eu fui ler na internet a referida tese de mestrado, nem uma referência sequer ao meu nome. Muito menos, agradecimento.
Quando comecei minhas pesquisas sobre os tipos populares de Natal, procurei logo dois mestres vivos do assunto em questão, Veríssimo de Melo e Augusto Severo Neto. Depois, fui ler os memorialistas, como João Guimarães e Jaime dos Guimarães Wanderley, que eu cheguei a conhecer bastante idoso, mas lúcido e conversador, apresentado pelo amigo Ivo Wanderley, seu filho.
Nenhum deles havia se referido em suas conversas ou obras à prostituta ambulante que toda a Natal conheceu nos anos 80 e 2000, com o nome de batismo de Maria Edite, mas apelidada devido suas andanças de ‘Rocas Quintas’. Pois bem, essa foi respeitosamente citada em um dos contos do escritor e amigo Nilo Emerenciano, em seu livro de 1982 – ‘Aconteceu na Quinta Delegacia’. Depois, a entrevistei várias vezes na calçada do finado Café São Luiz, no centro da Cidade Alta, aonde a mesma sempre chegava às tardes para pedir ajuda financeira no intuito, segundo ela, de comprar medicamentos para se tratar de doenças sexuais. Cabelos pretos curtos, desdentada, obesa e semi analfabeta. Moradora das confluências entre Petrópolis e Praia do Meio. Houve vários desencontros da referida e o meu amigo fotógrafo Canindé Soares, e a famosa ‘Rocas Quintas’, a única na história natalense com este apelido, não apareceu no meu livro de 1999 – ‘Natal, Personagens Populares’.
Outro dia me causou enorme surpresa em ver que estão atribuindo à professora seridoense, Júlia Augusta de Medeiros, o apelido da natalense dona Maria Edite. Eu só queria saber, quem diabo soprou nos ouvidos desse pesquisador histórico essa infâmia? De quais livros são as referências para tal disparate? Seria até óbvio chamar parte dessa internet de Casa de Mãe Joana. E muitos pesquisadores e pesquisadoras de abrigados e abrigadas da tal Casa/Bordel.
Para finalizar essa missiva longa, eu vou me referir a tal ‘Casa da Mãe Joana’, que deve abrigar certos ‘renomados pesquisadores’ do momento virtual. Tudo que se relaciona com a vastíssima e séria cultura popular e seu folclore eu tenho que, por justiça, procurar o pai dos burros, o nosso Câmara Cascudo, em seu livro ‘Locuções Tradicionais no Brasil’, segunda edição, 1977: “Onde todos têm vontade, domínio, liberdade. Podem entrar, dispor, mandar. Confusão, balbúrdia, desorganização… Joana, rainha de Nápoles e Condessa da Provença, (1326-1382) … regulamentou os bordéis da cidade…”.
E sobre a fala do nosso povo tenho muitas obras, mas vou citar apenas a do escritor e professor Reinaldo Pimenta, autor do livro ‘A Casa de Mãe Joana’, 2002, que trata sobre as expressões e ditos populares, em parte coletadas em Câmara Cascudo, como acusa a sua honesta bibliografia. Pesquisas sem citações é ficção lendária. E o resto, como me dizem na feira do Alecrim – são favas contadas!
// Morada São Saruê, Nísia Floresta/RN.

3 respostas

  1. Existem pessoas que querem escrever e o fazem de qualquer maneira. As vezes para eles o mais importante não é a fidedignidade dos fatos da história para qual ele ou ela se inclinou para registrar com palavras. Essa atitude é lamentável principalmente quando relata a vida de pessoas, sejam elas quais forem. Por isso a importância das autobiografia pois elas nos convidam a informações mais precisas.

  2. Caro amigo e escritor Gutemberg Costa, que Deus lhe dê muita saúde para continuar defendendo a cultura do RN, em especial a cultura popular…

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