Coletivo Foque: Puxando o fio da memória numa teia que celebra 21 anos

Fotografia: Taiana Marques/Coletivo Foque

O Coletivo Foque reafirma o tom empoderado do seu bate-papo inaugurando estúdio próprio na Zona Norte de Natal. Um território livre com lugar de fala que não descola da identidade social, política e cultural do nosso povo.

A reunião festiva ocorrida na tarde de quinta-feira [24/04] contou com uma rede colaborativa que não vacila quando o assunto é cultura e causa social. Logo no começo do nosso bate-papo, a produtora cultural Denyse Amaro mandou o recado sobre a importância de fazer cultura na zona norte da cidade. “Que a gente não precise atravessar a ponte pra ter acesso à cultura”. Bem ao nosso lado, o ator e coordenador do Comitê de Cultura do RN, Rodrigo Bico, explicou que esse novo programa do Ministério da Cultura atua na formação e mobilização social e tem o papel de preparar a sociedade civil para ter acesso às políticas culturais e aos recursos do Ministério da Cultura. “Vamos realizar agora uma série de conferências livres de cultura organizadas pela sociedade civil. Elas são livres porque não tem ligação direta com a conferência municipal, estadual ou nacional, uma tentativa de estimular a reorganização das cadeias produtivas da cultura.”

Puxando o fio da memória nessa teia que celebra resistência, durante a roda de conversa sobre patrimônio histórico e cultural o historiador Luciano Capistrano afirmou que “falar de cultura, falar de patrimônio, falar de identidade, é falar de esperança e falar do lugar,” fazendo coro com tantos outros ofícios que marcaram presença nesse fluxo de trabalho coletivo. Tudo junto e misturado com a exposição de fotografia, o movimento indígena Okarusupytã [que além da roda de peteca fez doação de livros para sorteio e aproveitou para gravar o jornal Marandu em nosso estúdio].

O Kurta na Kombi chegou com o cinema itinerante e ocupou o espaço para exibir o documentário Cordel na Cena Natalense, uma obra audiovisual que leva para a tela o universo cordeliano, dando voz a artistas, pesquisadores e amantes dessa literatura popular. De repente, personagens do filme se levantam no meio da plateia para dialogar com o tema exibido. Chico de Iaia afiou o seu cordel e respondeu ao desafio.

Eu já vi muitos doutores
Gente que possui mestrado
Se metendo a escrever
Mas não faz metrificado
Até mesmo pedagogo
Se não conhecer o jogo
Vai fazer de pé quebrado

Por isso é que o cordelista
Tem habilidade extrema
Pra pegar qualquer história
De um determinado tema
Ler pra poder condensá-la
E depois de interpretá-la
Transformá-la num poema

Depois foi a vez de outro cordelista da Casa do Cordel se apresentar no próprio verso: “Meu nome é Gelson Pessoa/Sou de uma terra tão boa/Que falo nela onde vou”.

Santo António é uma cidade
Que com certeza tem sorte
De ter um filho ilustre
Xexéu um poeta forte
Que hoje é patrimônio
Do Rio Grande do Norte

Ele é patrimônio vivo
Que nos causa alegria
Um poeta que escreve
Com a maior maestria
Sendo Xexéu Dom quixote
Seu Sancho Pança eu seria”.

// Ganhadores do sorteio:

Júnior Palhares
Livro: Memórias de um Cigano – José Soares

Guajiru Silva
Livro: O Golpe Militar no RN – Luciano Capistrano

Denyse Amaro
Livro: História e Cultura Indígena – Aucides Sales

A nossa Reunião Festiva foi encerrada com o poeta Arapuá cantando coco [para isso contou com o auxílio luxuoso do pandeiro] fazendo valer a cultura presente do lado de cá da ponte.

Sou nascido e criado pela Zona Norte
Banhado nas águas da Lagoa Azul
Foi chupando manga, cajá e caju
Que tirei meu nome da lista da morte
Eu não sei bem dizer se é azar ou é sorte
Ser pobre, caboclo e com veia artística
Natal capital, cidade turística
Pra jovem nativo é servir ou porrada
Só sei que fui salvo de ter vida errada
Pois passei dos trinta, falhando a estatística

Assim, a língua embolada do cantador deu voz à inventividade poética cantando coco voltado.

Imagina em meio a essa Reunião Festiva o “ator extraordinário” chamado Chico Daniel mostrando a sua arte de brincar com bonecos, juntamente com o Boi Calemba do Mestre Manoel Marinheiro ou o Boi Calemba Pintadinho do Mestre Dedé ou o Pastoril Dona Joaquina. O Coletivo Foque não poderia celebrar a imprensa livre e a cultura sem a memória de Mestres e Mestras da nossa cultura popular. Igualmente a tantas expressões e saberes ancestrais que precisam de apoio para se transformarem em verdadeiros espetáculos e continuar impulsionando a arte e a justiça social.

Mesmo sendo barrado em bailes que costumam tratar a imprensa livre, a memória e toda uma diversidade de brincantes como maus elementos, o jornalismo criativo do Coletivo Foque vai sobrevivendo junto a uma rede colaborativa que precisa ser valorizada e respeitada.

Venha se juntar e se misturar de mão dada com um coletivo de resistência que celebra 21 anos com ousadia e muita rebeldia potyguaretáme.

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