Eleições no México: Uma análise das lutas e a ilusão de transformação social.

Claudia Sheinbaum é a primeira presidenta da história no México – Fotografia: RS via Fotos Publicas

O pano de fundo das eleições mexicanas não está centrado na capacitação gestora nem no currículo das candidatas. Eis o que o lobby da mídia de mercado em todo o mundo nos faz crer, propalando o currículo acadêmico meteórico de uma e a vida de superação de origem étnica indígena, de outra, até sua conquista política e empresarial.

Tal mensagem subliminar dirigida ao público e às massas sobre a capacitação intelectual, meritória, administrativa e política das candidatas no enfrentamento de desafios históricos, estruturais, que estão além das urnas e das querelas entre ambas.

A imprensa burguesa ressalta o brilho das candidatas e a esperança que representam para o eleitorado, no sentido de escamotear a realidade, tornando-a politicamente mais palatável ao público, quando na verdade esse pleito trata-se da legitimação de um estado excludente, apodrecido, corrupto, opressor e assassino.

Diante disso, a começar pelos assassinatos e emboscadas dos dois líderes da Revolução Mexicana, Emmiliano Zapata e Pancho Villa, e os subsequentes assassinatos políticos, massacres, chacinas, tais a de Tlatelolco, maio de 1968, a guerra suja de 60 a 70, Acteal (1997), Ayotzinapa (2014), perpetrados pela burguesia, filha prostituida da Revolução Mexicana.

Essa burguesia através de seu partido PRI (Partido Revolucionário Institucional), criado em 1929, substituiu o PRM (Partido Revolucionário Mexicano) de Lázaro Cárdenas, mais afinada com os ideais da Revolução Mexicana: reforma agrária, ensino público, reforma social urbana, estatização e soberania.

A burguesia caudilhesca, populista, reformista, sequestrou o imaginário da Revolução Mexicana para nomear seus partidos. Andrés Manuel López Obrador (1988) rompeu com o Partido Revolucionário Institucional para formar PRD (Partido da Revolução Democrática), e saiu deste para criar em 2011 o MORENA (Movimento de Regeneração Nacional).

Esse “novo” nome na política supõe-se mais um sequestro do imaginário associado à Revolução mexicana, o anarquismo, e o Jornal Regeneração, escrito por Flores Magón, que participou da Revolução Mexicana, de 1910 a 1917, considerava-se indígena, era muito voltado para suas causas.

Diante deste quadro picassiano da política burguesa, e que muda apenas a forma, mas o conteúdo continua perverso, excludente, tendo apenas aperfeiçoado o método ditatorial de Porfírio Días, que tiranizou o México de 1876 a 1909, 33 anos de oligarquia sanguinária, culminando com a Revolução Mexicana em 1910.

São várias frações da burguesia em luta pelo controle do estado. Na eleição de 2002 a fração neoliberal do PAN (Partido da Ação Nacional), um velho partido reacionário criado em 1939, pôs fim à hegemonia do PRI ao eleger um empresário neoliberal, Vicente Fox, desbancando 71 anos de poder, o que levou o escritor peruano Vargas Llosa afirmar: “O México é uma ditadura perfeita.”

Então, inspirado nesta “ditadura perfeita”, seja por razões econômicas, históricas, culturais, políticas ou psicossociais, o teatro eleitoral foi armado para renovar a esperança às massas e representar as subjetividades emergentes: meio ambiente, ética política, combate à criminalidade, atendimento às pautas LGBTQIA+, imigrantes, questões étnicas, feminismo e sua luta contra o estupro e o feminicidio.

Assim, foi encerrada a campanha com muita expectativa e entusiasmo, embora em clima de violência e medo nunca vistas, com 34 candidatos assassinados, sendo a maioria pertencente à Frente Juntos Faremos História, da candidata da situação. Segundo análise, esses assassinatos foram cometidos pelo crime organizado para influir nas eleições locais.

Apesar da violência, os eleitores compareceram às urnas e sufragaram a candidata governista Claudia Sheinbaum Pardo, pela Frente Faremos História, PT (Partido Trabalhista), MORENA (Movimento de Regeneração Nacional), PVEM (Partido Verde Ecologista do México), todos partidos sociais democratas ou de “centro esquerda”, que a mídia os denominam de esquerda.

Por outro lado, a candidata perdedora, Xochitl Gálvez, da Frente Ampla Pelo México:  PAN (Partido da Ação Nacional), PRI (Partido Revolucionário Institucional), pasmem, membro da Internacional Socialista, PRD (Partido da Revolução Democrática), Movimento Cidadão, os dois últimos considerados de esquerda.

A banalização de siglas partidárias afirmando-se revolucionarias, democráticas, ou de esquerda, é uma verdadeira chanchada e incoerência com o mínimo de moralidade política, haja vista o acordo espúrio, criminoso, entre o PAM e o PRI em troca de apoio para não abrir arquivos sobre incriminação do PRI em vários crimes.

Quanto à Xochitl Gálvez, apesar do apoio dos partidos mais tradicionais, no seu discurso em defesa do aborto, dos direitos LGBTQIA+ e até dos programas sociais do presidente que seu partido rejeita, mas que ela apoia por considerar-se uma liberal, mesmo assim teve uma derrota acachapante, pouco mais da metade dos votos recebidos.

Já a eleita, Claudia Sheinbaum, irá seguir a plataforma política programática do Movimento de Regeneração Nacional, cuja estratégia é baseada em três acontecimentos históricos importantes ocorridos no México: O Movimento de Independência (1821), O Movimento Contra o Conservadorismo, liderado por Benito Juárez (1858–1861), e a Revolução Mexicana de 1910.

A quarta transformação do Movimento MORENA seria política de reformas sociais indicadas por Andrés Manuel Lópes Obrador, um neo desenvolvimentista que tem valorizado o salário mínimo e tomado algumas medidas moralizantes no âmbito da administração pública, mas incapaz de uma resposta democrática aos diversos crimes cometidos pelo estado.

Além disso, o seu governo, assim como os demais, convive institucionalmente desde 1930, período de recessão nos Estados Unidos, com as maquiladoras, empresas norte-americanas instaladas na área de fronteira, aproveitando-se dos baixos salários e dos contratos de trabalho sem vínculos de direitos.

Essas empresas contratam jovens mulheres entre 15 e 19 anos, de baixa escolaridade, na atividade da indústria têxtil, um trabalho considerado reprodutivo, ou seja, na área de serviços. Isso porque são familiarizadas com as atividades domésticas, são dóceis, não procuram direitos e se submetem passivamente ao assédio.

Muitas destas empresas exploram o trabalho infantil, obtendo dessa forma uma super mais-valia, com salários baixíssimos de $ 1,02 dólares a hora de trabalho, enquanto suas matrizes nos Estados Unidos da América pagam $ 17,70 a hora, estão submetidas à taxações alfandegárias e a não remessas de lucros ao exterior, o que não acontece com as maquiladoras, que estão estabelecidas em ZPEs (Zona de Produtos Exportáveis).

Essa realidade foi aguçada com o NAFTA, acordo comercial entre Estados Unidos, México e Canada, em 1994, levando o México a pais de exportação de produtos primários, único setor econômico nacional beneficiado pelo acordo, tornando o país de característica econômica de base colonial e importador de manufaturas, em detrimento do desenvolvimento da indústria.

Tal relação desigual entre Estados Unidos e México, torna este último subalterno aos interesses do império. Como se não bastasse a anexação de grande parte de seu território com a guerra ocorrida entre ambos (1846–1848) com a derrota do México e o acordo de Guadalupe e Hidalgo, no qual o México perdeu os seguintes territórios: Texas, Nevada, Utah, Arizona e Califórnia. O que motivou a lacônica frase de Lázaro Cárdenas: “Pobre México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”.

Quanto à Quarta Transformação proposta pela burguesia mexicana, não contempla efetivamente os de baixo, pois, não alcança transformações estruturais. Só haverá regeneração e emancipação social quando o modo de vida originário fundamentado socialmente na horizontalidade e no equilíbrio entre o homem e a natureza for a estratégia das massas exploradas mexicanas, caso contrário, o caos e a continuidade da degeneração social.