Do Encanto à Casa do Cordel

por NANDO POETA
Ponto de Memória Estação do Cordel

O Ponto de Memória Estação do Cordel vem produzindo uma série de artigos sobre a memória do cordel em Natal, que estão sendo publicados no site foque.com.br, a imprensa alternativa e independente.

Um dos artigos foi sobre a presença do cordel em Natal, onde localizamos toda trajetória dos espaços constituídos em terra potiguar para a comercialização e propagação do cordel, que além de serem divulgados em praças e feiras, também tinham seu espaço físico, como nas Lojas Ramos & Irmãos – A Paraibana na Ribeira, ou a casa do casal Antonio Emídio da Silva e Dona Maria Amélia Jesus localizada na Rua Coronel Estevam,1325 (Avenida 9) no bairro do Alecrim.
Em Natal era quase uma tradição termos os locais de venda de cordel, que servia como um ponto de encontro com quem se alimentava daquela arte.
Nos anos 80 e 90 poucos locais existiram no mundo cordeliano em Natal. Naquele momento contávamos com a trincheira do Recanto do Seridó, espaço de resistência localizado no Conjunto Candelária, aberto pelo poeta Zé Saldanha que se deslocou da cidade de Currais Novos, em 1979, para Natal.
O cordel sempre foi um polo de resistência. Nesse mar cordeliano, existiram vários projetos que mantiveram a chama do cordel acesa.
O Projeto Memória da UFRN, entre os anos de 1980 e 1982, publicando diversos títulos de cordéis de autores que atuavam no Rio Grande do Norte e eram ilustrados com xilogravuras de artistas presentes em nosso Estado. Em 1995, foi impulsionado o Projeto Chico Traíra pela Fundação José Augusto, que teve o objetivo de publicar os cordéis de autores que habitavam o solo potiguar. Foi com esse cenário que o cordel chegou ao final do século XX. 
Iniciamos o século XXI sem nenhuma referência de aglutinação do cordel em Natal. No primeiro lustro do novo século, o movimento cordeliando estava pulverizado com poucos poetas erguendo a bandeira, como também uma forte redução no público leitor da cidade.
No final do ano de 2005, ocorreu uma Feira do Livro e da Leitura organizada pelos órgãos públicos, que serviu para abrir o caminho para um reencontro do cordel em Natal. Esta feira cultural foi realizada em cinco dias no final de novembro daquele ano. A presença do cordel nesta feira sinalizou para dar um novo rumo ao cordel em Natal.
O palco desse grande encontro aconteceu na Praça Cívica, a antiga Praça Pedro Velho. Neste evento estiveram presentes Erivaldo Leite (Abaeté do Cordel), Paulo Varela, Boquinha de Mel, Izaias do Cordel e José Acaci. A maioria deles não se conheciam, foi nesse encontro literário que os laços de amizades abriram as portas para iniciarem um processo do movimento cordeliano em Natal.
Nesta feira literária os poetas estiveram expondo os seus cordéis, a maioria deles estavam iniciando a sua trajetória nesse mundo literário. Naquele momento, o poeta Izaias aproveitou para lançar o seu cordel Chico Catatau e o poeta Abaeté lançou o seu: “O casal que engatou no parque industrial: boatos de Natal”.

O Poeta Paulo Varela aproveitou o momento da feira para divulgar o cordel que fez em parceria com a poeta Vânia Freitas, lançado na cidade de João Pessoa em setembro de 2005, com a xilogravura de Abraão Batista.

A partir dessa presença na feira literária, os laços entre os poetas se alargaram, e as conversas sobre a importância de se constituir um espaço aglutinador de poetas, educadores e do público em geral, amantes do cordel, só se fortaleceram. Os poetas Abaeté e Paulo Varela, sensibilizados com a ideia de trazerem novamente o cordel ́para a Cidade Alta, o coração de Natal, fundaram em 2006 “O Encanto do Cordel”, instalando-se onde havia funcionado a TV Universitária, localizado na rua Professor Zuza com a Rua Princesa Isabel. 
Neste prédio, os artistas de Natal constituíram a República das Artes, um espaço que passou a reunir diversos movimentos artísticos da cidade de Natal.
O Encanto do Cordel com suas portas abertas, tendo à frente os poetas Abaeté e Paulo Varela, passaram a desenvolver ações de propagação do cordel na cidade.
No local passou a funcionar uma loja com os folhetos de cordel expostos à venda. A realização de encontros, com o objetivo de acolher o público, passou a fazer parte do local. Com a frequência regular, as pessoas se sentiram estimuladas, passando a escrever e publicar seus cordéis. O poeta Paulo Varela, além de fazer seus escritos, desenvolveu a técnica da xilogravura, e passou a ilustrar seus próprios cordéis e dos parceiros, influenciando pessoas para mergulharem nessa arte plástica.
O folheto com o título “O Encanto do Cordel” foi elaborado por Abaeté, utilizado para propagar o novo espaço cordeliano. Abaixo reproduzimos fielmente algumas das estrofes desse cordel.
“Todo mundo reclamava
Que em Natal faltava
Uma boa Cordelaria
Fizemos o nosso papel
Abrimos O  Encanto do Cordel
Um recanto da poesia.
Com Homenagem sincera
Eu e Paulo Varela
A José Saldanha Sobrinho
Poeta maior renomado
Por todos nós respeitado
Seguimos o seu caminho.
Uma das estrofes divulgava os conteúdos do cordel disponível para a venda no espaço:
Temos cordéis famosos
Gracejos e religiosos
Romances, assombração
Política, temas atuais
Antigos e novos carnavais
Cascudo e Lampião.
O poeta Paulo Varela, um dos fundadores do Encanto do Cordel, é natural de Açú, criado no bairro do Alecrim, mas sem nunca esquecer as suas raízes, a terra dos Poetas, conviveu por um tempo com a seara poética no Crato/CE.
Erivaldo Leite de Lima (Abaeté) é natural de Sertânia, cidade pernambucana banhada pelo rio Moxotó, a terra que brotou do amor de uma fazendeira Catarina com o boiadeiro Antão.
O Encanto do Cordel teve uma passagem efêmera em Natal, pouco mais de um ano, os seus fundadores trilharam caminhos distintos na cena poética. Até o dia de hoje não sabemos os motivos exatos para o desencanto entre os dois poetas que terminaram se separando e abortando o espaço que fora criado por ambos. 
Sabemos que Paulo Varela na época abraçou o Projeto Casa de Taipa, espaço construído geralmente nas Feiras Culturais realizadas no Rio Grande do Norte, como a Festa do Boi, a Cientec e a Fiart.
Já o Abaeté abraçou a fundação da Casa do Cordel, que foi fundada no dia 17 de agosto de 2007, junto com a formação da Associação dos Cordelistas de Natal (Unicordern), se tornando o presidente desta Associação que não prosperou no seio dos cordelistas.
Por outro lado, os poetas Izaias, Rodrigues Neto, Rosa Regis, MC Garcia, Professor Cláudio, participaram de uma articulação para constituírem a Associação Potiguar de Literatura de Cordel (APLC), ainda em 2006. Mas esse movimento não prosperou.
Em junho de 2007, o movimento sindical que deu origem à jovem Central Sindical CSP Conlutas e algumas entidades sindicais (Sindprevs, Sindsaúde, Bancários, etc) realizaram em parceria com a Casa de Cordel, uma campanha em defesa do meio ambiente, onde realizamos um evento no Calçadão da João Pessoa.
Neste dia colocamos uma canoa recheada de lixo retirado do Rio Potengi e fizemos uma distribuição de 1000 exemplares de cordéis adquiridos pelo movimento sindical. Os cordéis de autoria de diversos poetas abordaram as questões de meio ambiente. Durante a tarde inteira a música e a poesia ecoaram no Grande Ponto.

A Casa do Cordel foi instalada em um imóvel da Rua Vigário Bartolomeu, na Cidade Alta, e se transformou em um ponto frequentado por poetas e admiradores do cordel, promovendo encontros de artistas populares, além de feiras, exposições, palestras, lançamentos de livros e saraus culturais.
Em 2011 a Casa do Cordel impulsionou a constituição da Academia Norte-rio-grandense de Literatura do Cordel (ANLIC), apesar de seu responsável Abaeté não se propor a se integrar aos quadros da Academia. Na presidência da entidade já tivemos Rosa Regis, José Acaci e agora temos a Tonha Mota que exerce o seu segundo mandato.
O QUE É A ANLIC?
Por Tonha Mota
ANLIC é instituição
Sem nenhum fim econômico
Um coletivo harmônico,
De grande interação,
Cuja aglutinação,
De poetas, educadores
Preservando os precursores,
Com toda convicção
Ativismo em ação,
Agregando mais valores.
Desde a composição,
Tem esse objetivo
Através do coletivo
Fazer a divulgação
Por em prática a formação
Do cordel em cada escola
Seja tocando em viola,
Ou pela declamação
Assim a educação
Com Academia decola.

  

Seminários, palestras e Feiras passaram a serem realizadas e proporcionaram momentos de reflexão sobre o cordel.
No período entre os anos de 2012 e 2016, durante os eventos realizados, estiveram por Natal participando das rodas de conversa várias figuras do mundo cordeliano brasileiro, como: Aderaldo Luciano, Varneci Nascimento, Franklin Machado, Lucineide Vieira, Aldy Carvalho e por último Arievaldo Viana, lançando o seu livro, Leandro Gomes de Barros: Vida e obra. Na Casa do Cordel se realizavam os lançamentos dos cordéis, saraus e o café com poesia
Em novembro de 2013, realizamos a Iª Semana do Cordelista em Natal e neste evento aprovamos a CARTA DOS CORDELISTAS EM NATAL.
“Nesta carta de Natal
Queremos que o cordel
Tenha reconhecimento
Do valoroso papel
Que ao longo de sua história
Formou muito menestrel
Nós, poetas, pesquisadores e amantes da arte, participantes da I Semana do Cordelista em Natal, cansados de ficarmos relegados pelas políticas públicas culturais de nosso município nos insurgimos contra essa marginalidade e passamos a exigir do poder público o reconhecimento e o apoio às atividades culturais desenvolvida pelo movimento cordeliano desta cidade.”
De posse dessa Carta fomos à Câmara Municipal de Natal e articulamos a partir do mandato socialista do PSTU, exercido pela professora Amanda Gurgel, sensibilizar o conjunto dos (as) vereadores (as), que aprovaram por unanimidade a definição no Plano Plurianual – PPA um recurso de pouco mais de R$ 400 mil para ser destinado ao cordel nos quatro anos. Esta verba seria para ser ordenada nas políticas dos editais.
O movimento cordeliano passou a definir junto com a Funcarte os passos da elaboração dos editais. Foram constituídos para essa primeira etapa 9 editais.
A Casa do Cordel, que havia se transformado em uma Associação Cultural, organizou vários projetos, tendo ao final selecionado três projetos dos nove editais: o Projeto Cordel na Praça, A Xilogravura nas Escolas, e o Concurso de Cordel. Cada um foi contemplado com R$ 12 mil em média.

Os projetos foram executados no ano de 2015. A proposta era que uma parte dos recursos seriam destinados para a Associação Cultural Casa do Cordel, outra parte seria para financiar a realização dos projetos, com cachês, premiações, etc. E assim tentamos cumprir o que havíamos aprovado nas reuniões do movimento, mas nem tudo saiu como planejamos. No final de tudo, se teve dificuldades na prestação de contas, e terminou com as diligências da Funcarte solicitando as explicações sobre a aplicação dos recursos do prêmio.
Esta situação abriu uma fissura no movimento cordeliano, que se refletiu dentro do Iº Círculo Natalense do Cordel, realizado em 2016. Depois deste evento, surgiu a articulação para a constituição de outro movimento em Natal, que explicaremos no próximo artigo.
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