
Aos que sempre suaram a camisa — e a alma — para erguer esse país de contrastes e cantigas, vai aqui um tributo sem gravata, mas com punho cerrado e coração batucando no compasso da luta.
Vivem dizendo que o povo brasileiro é manso, que se acomoda, que aceita. Mentira repetida mil vezes ainda é mentira. O que somos, de verdade, é um povo que resiste desde o primeiro grito sufocado na invasão. Os povos originários disseram não à cruz e à espada. Os sequestrados da África se aquilombaram, se rebelaram, acenderam fogueiras na mata e na memória. Não aceitaram o tronco como destino nem o açoite como silêncio. Lutaram, e lutam.
Enquanto os barões erguiam salões, os de baixo construíam solidariedade. No vai e vem das ferrovias, nos porões dos portos, nas oficinas e tipografias, surgiam associações, germinavam sindicatos. Estivadores, marceneiros, ferroviários, gráficos — ah, os gráficos! — esses, lá pela metade do século XIX, já tinham jornal pedindo o fim da escravidão e do império. Lutavam com tinta, papel e coragem.
Sempre foi assim: quem vive do suor, sonha com liberdade. Quem levanta muros e calçadas, sonha com pontes e assembleias. Quem molda madeira e aço, sonha com uma sociedade onde nenhum patrão dite o ritmo do compasso.
Aqui na Ilha (São Luiz do Maranhão), caminhando a pé — que é como se conhece de verdade uma cidade — tropecei num prédio antigo, com ares de passado altivo. Era ali o velho Sindicato dos Cabeleireiros. Imaginei as histórias presas nos espelhos e nos fios cortados. Hoje, o mundo do trabalho virou um liquidificador sem tampa: entregadores de app, analistas remotos, influencers precarizados, educadores esfolados pela terceirização. O capital segue voraz, sugando até o último resquício de vida produtiva. Mas a chama da organização não se apagou.
É hora de reinventar o sindicato com a mesma irreverência de quem sobrevive em meio ao caos. Que ele abrigue os novos debaixo do seu velho teto. Que tenha wi-fi, assembleia e café passado na hora. Que receba o programador e a diarista, o ciclista do delivery e o poeta de rua. Porque onde houver exploração, haverá resistência. E onde houver resistência, haverá também a beleza de um povo que não desiste, nem mesmo quando tudo parece ruir.
Porque a luta — essa, sim — é o mais brasileiro dos patrimônios.