Feiraterapia em São José de Mipibu

 

por GUTENBERG COSTA // Contador e ouvidor de histórias do povo
Fotografia: Nilson Eloy

A feiraterapia de hoje é na terra do suco da mangaba. Café com carneiro torrado no mercado de São José de Mipibu. Conversas e escutas de causos e lorotas do povo simples e feliz. Quem vai a uma feira, na volta, tem assunto para um livro volumoso.

Minhas duas filhas, que não são apaixonadas por feiras quanto o pai, dizem que estas são a cara do painho. Sou da feira do Alecrim e do cordão azul do pastoril. Em carne e osso. Sou do tempo que minha mãe, dona Estela, me proibia de gargalhar quando ouvia na feira, porta de nossa casa, na Avenida 1, em Natal: “Esse menino é o focinho do pai. Cagado e cuspido, seu Geraldo Costa”.
Um dia, a convite de um amigo fui a sua cidade interiorana de Pernambuco. Era uma sexta-feira. Ao acordar no sábado, bem cedinho, soube da empregada dos donos da dita casa que o café só seria servido às 9h, quando os mesmos acordassem. Como matuto pergunta tudo, indaguei de dona Maria qual era o dia da feira daquela cidade. E por grande sorte, a velha disparou na bucha: é hoje e fica aqui bem pertinho.
Com a boa resposta, passei sebo nas canelas e fui tomar café na abençoada feira. Saco vazio não se põe em pé, dizem os inteligentes. Levei a agenda de papel e caneta, como sempre faço, fui enganar as tripas e conversar fiado com o povo feirante. Anotei de apelidos a causos. Não vi ninguém se maldizendo ou rogando pragas.
Na volta para pegar o meu matulão, a cara do meu anfitrião estava a maior do mundo. O rico chateado com o pobre. Rico que dormia muito e o cigano pobre, que ainda acorda cedo e corre atrás de feira.
No Rio de Janeiro, troquei o café suculento e luxuoso do hotel pelas iguarias deliciosas da feira de São Cristóvão. Não adianta, ou elas me perseguem ou eu a elas. E como diria Guimarães Rosa, saí da feira do meu Alecrim, há décadas, mas a danada boa e zoenta não sairá de mim. Parece que colou, tal qual o grude cola que eu fazia para segurar o papel nos palitos de coqueiros de minhas velhas e saudosas corujas.
Morada São Saruê, Nísia Floresta (RN)

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