LAB/RN e a dança da resistência

A dança da resistência. Fotografia: Rogério Marques

Essa matéria é mais um Lugar de Fala
onde a arte e os falares da cultura se manifestam.

Em debate, a política cultural e a valorização de artistas das mais diversas linguagens, um papel que o Estado deveria assumir como prioridade de toda e qualquer gestão, fazendo valer os versos de cantadores como Galvão Filho e Enoch Domingos na canção Raízes.
Vieram de longe os falares
da cultura e do meu povo
Atravessando oceanos
quebrando a casca do ovo
Alimentando a verdade
que a arte nasce do povo
Mesmo com as dificuldades em meio à pandemia e a política anticultural de um governo que privilegia a ignorância, o show continuou. Ainda que em palcos virtuais. De manifestação em manifestação, movimentos de artistas trouxeram à luz o debate sobre políticas culturais adormecidas na pauta do poder público em épocas não eleitorais.
Uma reunião ocorrida na quarta-feira (10/11) entre representantes da Fundação José Augusto, Movimento Sou 1 de 11 milhões, Fórum Potiguar de Cultura e o Cordel voltou a colocar na ordem do dia a segunda rodada da Lei Aldir Blanc – LAB/RN.
O diretor da Fundação José Augusto, Fábio Lima, avalia que a reunião com as representações de artistas foi muito proveitosa, com muitas contribuições, “porque vamos ter um desafio grande para operar esse edital”. Ele aponta que a gestão incorporou as possibilidades de os produtos serem apresentados a partir de outras linguagens, e não somente através de vídeo, como era a ideia inicialmente apresentada. “Esse edital vai ser basicamente sobre a história de vida das pessoas e a gente tinha pensado o vídeo como um facilitador, mas vai ficar aberto”.
Fábio considera que o prazo está muito curto. “Tanto é que não vamos disponibilizar para consulta pública por conta da escassez do tempo, por isso nós chamamos os fóruns que são representantes dos vários segmentos para dialogar”.
O que levou a dividir o valor total de R$ 1.800.000,00 em 400 prêmios de R$ 4.500 mil foi para atingir um número maior de pessoas, segundo Fábio Lima. “Tivemos cerca de 800 projetos na primeira parte da LAB/RN que não foram habilitados. Esse vai ser o público alvo desse novo edital. Queremos atingir prioritariamente quem não foi comtemplado”.
Nessa segunda rodada da LAB/RN não será permitida a participação para quem ganhou três editas na primeira fase. “Essas pessoas vão ficar num cadastro reserva, caso os que não tenham sido contemplados não atinja os quatrocentos a gente vai puxando essas pessoas por ordem de classificação”, explica informando também que não haverá ponto de corte.  
“Antes da Lei Aldir Blanc, no início da pandemia, o Governo do Estado lançou um edital com recursos próprios chamado Tô em Casa e Tô na Rede. Há indicativos e nós vamos lutar para que no próximo ano a gente novamente lance editais com recursos próprios”, observa o diretor da Fundação José Augusto.
A produtora cultural Marcelle Janine, do Movimento Sou 1 de 11 milhões RN, avalia que o posicionamento da Fundação José Augusto, diante do tempo que está previsto para os recursos que restaram da primeira fase da LAB/RN, parece estar enraizado como um modo de fazer as coisas. “A gestão trouxe uma proposta pronta de edital, tanto na forma como no conteúdo. E aí a gente vai vivendo a cultura em nosso Estado dessa maneira”. Ela aponta uma problemática nesse edital porque amarra o produto à criação de um acervo. “Quem vai criar, como vai ser pago, como vai funcionar, quais os usos que serão feitos desse acervo?”, questiona.
“Lançar esse edital e não deixar o recurso voltar, é algo importante. Reconhecemos que isso requer trabalho, recursos humanos e tempo, mas essa é a função da gestão”, reflete a produtora cultural acrescentando que lamenta sair da reunião com as mesmas dúvidas, sem respostas oficiais e documentais. “Estamos pedindo apenas transparência com o uso dos recursos públicos, que é um direito de qualquer pessoa. E a justificativa que não há tempo para consulta pública reforça e perpetua o modelo de gestão com pouca participação dos profissionais da cultura. O estado de insatisfação e desrespeito permanece por conta do acúmulo histórico de uma não comunicação, da dotação orçamentária própria que não aparece. Digamos que essa reunião pouco resolveu o tamanho da angústia que a gente carrega no peito”.
Ela diz que o movimento pretende produzir um manifesto que conte a história de mobilização dos profissionais da cultura diante da gestão. “Para fazer valer os nossos direitos”, completa.
Na opinião do cordelista Hélio Gomes, a reunião foi produtiva porque o movimento de artistas mostrou organização. “Isso demonstra que se ganha com a luta coletiva. Os gestores precisam perceber que os fazedores de cultura não estão satisfeitos com a forma como a gestão vem tratando o setor cultural, que precisa ser visto como parceiro no processo decisório e não apenas para executar suas decisões”. Ele critica a exigência de 2 anos de experiência para participar do edital que será lançado ainda neste mês de novembro, “pois isso exclui quem está iniciando”.
Paula Lima, advogada e produtora cultural, fala que na sua avaliação a reunião na Fundação José Augusto “teve pelo menos um ponto positivo, fruto da mobilização” que foi reconhecida por todas as pessoas presentes. “Quando a gente começou a se mobilizar, a gestão voltou a se movimentar para que existisse alguma possibilidade de uso desses recursos, que segundo o parecer oficial poderiam ser cancelados”. Para ela, a LAB/RN foi tratada de um jeito como se os debates jurídicos estivessem no campo de uma situação com tudo dentro da normalidade, como se não estivesse num estado de calamidade pública bem específica de uma lei emergencial. “Toda a preocupação com a tramitação, como a Lei 8.666 indica, o desconto de imposto de renda para pessoas que estavam praticamente paradas, isso tudo é muito triste por que levou a gente a passar por uma série de situações como no caso dos empenhos”.
A representante do Fórum Potiguar de Cultura critica que o novo edital proposto continua insistindo em criar limitadores, como um só prêmio por proponente, além de pessoas não poderem concorrer com CNPJ que não sejam MEI – Microempreendedor individual. Por conta disso, há uma preocupação do Fórum que ainda sobre verbas. “Na opinião do movimento de artistas devia ser realizado um novo edital como o de fomento com produtos culturais simples, com a possibilidade de articulação da cadeia produtiva da economia criativa. Esse edital está se baseando em inscrever um produto que vai registrar a história de vida do fazedor de cultura, algo que também mina um pouco a ideia do produto cultural, que, não necessariamente isso pode ser o interesse da pesquisa de artistas que estão se inscrevendo, que podem preferir fazer outro tipo de produto que já é o seu trabalho”, afirma Paula Lima.

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