Sistema penitenciário: Barril de pólvora a espalhar terror no Rio Grande do Norte

Foto tirada durante inspeção do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura mostra presos em posição de ‘procedimento’ em unidade prisional no RN. — Foto: Acervo do MNPCT, 2022.

A situação carcerária tem sido foco de debate em meio à violência que toma conta do estado onde mais de 30 cidades, incluindo a capital Natal, foram atacadas pela onda de incêndios a prédios públicos, comércios e veículos.

A Força Nacional de Segurança já desembarcou no RN centenas de militares que chegam para reforçar a segurança na tentativa de colocar um ponto final nesse cenário de violência. Durante um podcast¹ a jornalista Natuza Nery conversou com Bárbara Coloniese, perita do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, e Juliana Melo, antropóloga e pesquisadora da UFRN.

Bárbara, que revisitou unidades prisionais do estado no fim do ano passado, relata que “pouco mudou desde o massacre de Alcaçuz, em 2017”. Ela aponta condições “insalubres” para os detentos, alimentação “precária e imprópria para consumo”, acesso limitado a agentes de saúde, superlotação e agressões de agentes penitenciários.

Segundo Juliana, os detentos se revoltaram contra a tutela do Estado devido à “violações de direitos”, – como choques elétricos e maus-tratos com familiares – e apelam à violência. “Quanto mais uma prisão é violenta, mais uma sociedade é”, afirma a antropóloga. Ao descrever a origem e o avanço das organizações criminosas pelo território brasileiro, no caso do Rio Grande do Norte, explica que as duas facções mais poderosas podem ter se unido. Na sua opinião, a política de enviar as lideranças de facções para presídios federais pode revelar “mais violações de direitos humanos e expansão do crime organizado”.

Um relatório do órgão federal Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), aponta uma série de violações no sistema penitenciário do Rio Grande do Norte. O documento cita casos de tortura nas unidades prisionais, superlotação, comida estragada e presos com subnutrição e expostos a surtos de doenças, como tuberculose e dermatites.

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública afirma que os dados sobre encarceramento indicam a ausência de políticas prisionais eficientes e a expansão da população carcerária, que inclui um alto índice de pessoas presas sem condenação.

A servidora da saúde e integrante da CSP-Conlutas, Rosália Fernandes, lamenta que mais uma vez é a população que sofre com ataques criminosos e com a política falida de segurança pública dos governos. “De um lado, a população se vê diante das ações de facções, que acabam afetando o funcionamento de serviços como transporte, saúde e educação e impõem medo. De outro não há uma política efetiva de segurança pública. Ao invés de ações preventivas, de recuperação e medidas coordenadas com outras questões sociais, o que se tem é uma política de repressão e encarceramento em massa que nunca evitam situações como essa”, criticou Rosália.

Ela avalia que neste momento de crise, é dever dos governos garantir a defesa da vida da classe trabalhadora. O Sindsaúde/RN protocolou ofício exigindo dos governos estadual e municipais o fechamento das unidades de saúde que não sejam 24h, com a manutenção apenas dos serviços que possam ocorrer em home office. Nos demais setores, onde tal modalidade não seja possível, os trabalhadores devem ser dispensados do serviço para sua segurança, sem que isso configure falta ou necessidade de compensação. O documento exige também que as unidades com serviço de urgência e emergência tenham garantida a devida segurança para os servidores, com a presença da Guarda Municipal e a adoção de outras medidas necessárias, como transporte seguro.

Dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça revelam que o Brasil possuía 919.651 pessoas encarceradas até maio de 2022, fazendo o país ocupar o terceiro lugar no ranking dos países que mais prendem no mundo, atrás apenas da China e dos Estados Unidos.

Para a antropóloga e pesquisadora Juliana Melo, o efeito do tratamento precário à população carcerária brasileira – a terceira maior do mundo – é o fortalecimento das organizações criminosas. “As facções se aproveitam das misérias prisional”, avalia ao afirmar que o sistema carcerário como um todo é “um grande barril de pólvora prestes a estourar”.

 


Fonte: com informações do podcast O Assunto¹ do g1; UOL e CSP-Conlutas.

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